agosto 23, 2005

Meus textos "Acidente de trabalho" e "Casar, do verbo ir morar em uma casa construir lar e família", podem ser lidos no Pessoas do Século Passado deste mês. É só clicar no título do texto que já vai cair no site! ;)

agosto 21, 2005

é insustentável creditar fracasso ao ofício dos dias.
quando me pego pensando em chamas, evito qualquer lembrança-água
porque pensar deve ser feito até o fim - e bem feito.
lamento triturar redemoinhos, ou mixar violinos com rap
é que me sinto tão abismo, tão vazada
que muita gente chega a me dizer que consegue ver através de mim:
não transparência de personalidade, não algo assim.
é que me torno invisível, petisco que sobra na mesa do bar
(ninguém quer comer).
eu evito relacionamentos luz naqueles dias fotossensíveis ao extremo
porque eventualemnte tenho crises fisiológico-burguesas graves
e, estando com a barriga cheia e com roupas cheirosinhas,
vejo que tremo diante de algumas necessidades salivares - muito fracas.
existe um peso sobre os ombros de quem nasceu em certo ano
e geralmente vejo nos olhares dessas pessoas anais
uma trsiteza de dar dó; um calabouço terrível. e eu acenando tchau,
enquanto masco algum chiclete, bubble gum.
procurei nas prateleiras do supermercado o superlativo "felicíssima"
e me orientaram verificar na parte de frios.
havia alguns corações congelados de outrora, e eu até me lembrei dos donos.
mas o superlativo procurado eu jamais achei.

todo mundo tem acessos bestiais e hipotônicos,
alguns dizem que é bom chorar enquanto outros grelham frangos para o almoço.
fico com a segunda opção. porque há tanto choro cristalizado por aí,
tanta gente já chora por mim todos os dias,
(veja os mendigos do centro. e os desabrigados da última enxurrada?
os pivetes colados na cola e tantas outras coisas...)
tanta gente chora sem escorrer uma gota sequer de lágrima,
chora em forma de pés, mãos, tronco, bunda e estômago vazio,
que eu entendo que há coisa mais grave com que devo me preocupar.

ninguém fotografa um paraíso em vida, mas sorri nas fotos que tira;
ninguém precisa dormir em paz só porque há mais tristeza de se chorar,
não.
tolices.

minha maior preocupação é derreter na fila dos outros,
e rastejar por pouca coisa. medo de perder poeira, sabe como é.
sabe...
como é?

a gravidade atonita cerra minhas pálpebras enquanto respiro leite
e bebo gás carbônico, só pra nocautear meu coração.
mas passa.
depois que alguém levanta, do fundo do salão, e estende a mão
eu danço quarteirões infinitos sobre os calos da minha cidade querida.
e lembro de abrir as cortinas quando o sol nascer
para ofuscar os olhos
e banhar meu corpo numa cegueira sem fim.

agosto 12, 2005

Notinha fiscal do amor

Decidiu que escreveria uma carta. Coisa de mão, de letra. Seria mais um registro, mais um documento eterno. Notinha fiscal do amor. Seria a garantia. Não teria recusa, muito menos equívocos sobre o produto. E não era de se espantar a forma como tratava o que sentia. Amor feito copo plástico em aniversário cheio de penetras. (Papelão ainda tinha um valor mais simbólico - alguns artistas se utilizam do material como matéria-prima.) Por isso, era plástico mesmo. Mas longe de plasticidade estética. Era só porque era coisa comum. Mais um produto. E para o tal, emitiria o comprovante, a nota. Depois, assinada, entregaria a carta. E duas pessoas passariam a acreditar no amor. Duas pessoas passariam a acreditar nelas como possibilidade.
Comédia em cartinhas de amor. As impressões digitais na cena do crime. O riso contido perante o ridículo. Amor, ora essas. Mas mesmo assim escrevia, e cria, lia suas letras como verdade. Escreveu a carta. Entregou. Selou um sentimento assim. E anda por aí crente que vive um momento delicioso e verdadeiro. Mal sabe que acaba de cair numa teia inexistente. Mas deixa. O sabor do mel é sempre melhor que qualquer alerta banal...

agosto 01, 2005

sendo muito

não sei por que eu sufoco.
às vezes acordo com a sensação de que o mundo está pelo avesso
e chego a quase nadar em queda livre
diante da chaleira que ferve e me bafora mais um cigarro
de ar.
[reticente]
na minha velhice eu quero poder saltar de um trampolim
numa piscina de veneno.
e escaldar sob o sol noturno das persianas fechadas
para achar algum sentido
alguma coisa que perdi muito antes
em baixo de algumas almofadas do sofá da sala.
[volta]
ai, é que me dói. interjeição de dor é um frenesi hilariante.
eu andei injetando insegurança - doses cavalares -
e caí numa tremedeira pelo chão da manhã,
enquanto as paredes da noite e o teto da tarde desmoronavam
silenciosamente.
[indiferente]
tenho algum medo dentro de mim, falha na alma.
não sei da onde vem tanto vão, buraco, lacuna, espaço
uma montoeira de vazio que empilho na cabeceira da cama
e que, antes de dormir, folheio pra nunca esquecer.
[volta]
meus cinco dedos contam os despertadores que tenho pela casa;
jamais deixo de acordar, mesmo estando tudo pelo avesso e desconexo
e me visto e desço para o café.
[derramada]
quanto mais eu corro em minha direção, quanto mais próximo fica o concreto
eu
(idealizando me sentir entre as palmas da mão)
fico cada vez mais distante daquilo que me preenche
dessa substância densa e... volátil.
[volta]
pra onde mesmo?