novembro 19, 2008

Agora

A disponibilidade cansa. Às vezes - e também por isso -, eu me visto. A maquiagem não varia, e as mentiras se repetem sem que eu perceba.
A disponibilidade de caminhar e olhar para dia.
A minha disponibilidade também, eu que estou aí alardeando que consegui, agora que assumo, agora que estou - talvez pela primeira vez - cuidando de uma das verdades dos meus sentidos. Mas é tão cansativo; é tão expositivo. Dizer que quer; esperar, sonhar, desejar e, por fim, encostar. Mastiga energia. É uma revolução tamanha abrir os braços e abraçar a própria sorte. Eu quase sofro de medo. Mas como medo é covardia, reavalio as minhas estórias.
Porque antes era uma palavra talhada à moda de medo o que prendia as ações, encurtava a juventude e perturbava a respiração. Depois, chegou algo como que uma inconseqüência na vontade e nas declarações - um desejo de cansaço.

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Eu tenho pressa. Eu ultrapasso qualquer um, até você, quando assumo o medo e procuro transgredi-lo. Eu tenho pressa de vida, porque me afogo constantemente duarnte meses, e a minha rotina é toda tentar renascer - dia sim, dia não -, voltar, colocar a cabeça para fora da água e respirar.

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Eu tenho pressa e ultimamente estou correndo. De braço em braço, em segredo, com a ligeireza de quem não está em busca de algo final; mas em busca da busca de estar gerúndio, sentindo e percebendo o que é tocar a vida, estar entre pessoas.

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Eu tenho a pressa de misturar, embaralhar, provar simultaneamente e diferentemente as pessoas. A pressa que me põe a correr, sem fôlego, experimentando, porque a vida tem que ser sentida, e eu não posso mais me prender no medo - só nos fios do cabelo. A minha pressa hoje não tropeça, ela segue, esbarra, culmina às vezes no meu passado; mas tudo é reformulado, a minha sensação vira outra jamais imaginada, e eu rio como uma criança de fronte de um palhaço - a agonia transfigurada. Eu tenho pressa e não vou esperar, eu quero agora, eu preciso que seja presente.

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A minha paralisia é um prelúdio cínico dos meus anseios internos. Dê a mim um tempo que eu possa manipular, e eu acelero e tomo parte do mundo. A minha paralisia é falsidade; porque eu tenho pressa constante interna eterna (e escondo), estou indo ao encontro e doida para bater, para me chocar, para estraçalhar no encontro, sentir todos os prazeres, todas as dores, todas as doçuras e todas as torturas. E ter, por fim, a satisfação de sentir meu corpo quebrado em milhares de fragmentos, a ponto de poder reconstituir tudo novamente, uma vez mais.

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Eu quero agora, a espera dói. E a minha condição é violência.

novembro 15, 2008

(...) Com o corpo, porém, hoje espero tudo. Mas com o corpo eu sempre esperei; portanto, a exclusividade não é sua. Apesar disso, o fragmento de afeto reacende uma vez e outra, e canta vagarosamente além do corpo. Diz que há mais, e este é o perigo. Muito do sofrimento de não reter reside exatamente aí. Porque, quando tratamos só do corpo, há facilidades do desapego que justificam descuidar, procurar só quando sentir desejo e, ao contrário, não envolver com veludo de dedos as horas do seu dia. Contudo, agora começo a guardar os fragmentos de carinho. Às vezes, o rebuliço da maré os trazem à tona, mostrando o quanto eles existem, o quanto são possíveis apesar de toda a mentira dos meus disfarces. Em outras ocasiões, com o esforço de fingir, os fragmentos de carinho afundam - perco de vista a ameaça. Então, sobra apenas corpo e a sua linguagem. Há uma potência de assombro que me cala diante dessa constatação de haver afeto e haver mentira. Chego a não esperar nada racionalmente. Porém o corpo. Este espera um impacto, ainda remoto na idéia, mas dolorido a cada aproximação e fuga das minhas palavras.
Um dia, será pela voz a queda do vestido.